paris à go-go

crônicas sobre Paris e de sua ululante gente francesa

mardi, octobre 31, 2006

comes&bebes da Paris medieval

enfim descobri toda a verdade: as pessoas realmente se alimentavam em Paris na Idade Média! nada de pílulas ou energia prana, aquela gente sentava à mesa e comia, nada muito diferente de nós. os pobres também, naturalmente, comiam… pouco, é lá bem verdade, as coisas não mudaram tanto desde os idos de 1200. assim já seria querer demais! c’est la vie!

nos mercados de Paris, à ceu aberto, podia se achar de tudo, inclusive pratos prontos: era o tão falado fast-food medieval! na então praça de alimentação da Notre-Dame, saía muitos pedidos de “porées chaudes”, uma espécie de puré de legumes e gaufres, mas o que o povo gostava mesmo eram das massas, tudo servido em potes de cerâmica descartáveis. grande parte dos parisienses tinha apenas um braseiro para esquentar a comida ou cozinhar um ovo, então as massas caíam bem. sem opção, meus antecessores viviam defumados em seus casebres mal ventilados. os fornecedores ambulantes não ajudavam, colocavam seus “fornos portatéis” à disposição apenas dos endinheirados; então quem podia levava um peixe para dourar, uma carne para assar e até comprar molho pronto. aos burgueses nada faltava, o mundo já lhes estendia o tapete de gala!

o peixe chegava fresco graças aos pescadores da Normandia, que entregavam toda a noite na rue des Poissoniers. o gado vinha marchando do campo até o quartier chamado de “Grande-Boucherie”, nas redondezas da lindíssima Torre Saint-Jacques. os animais jovens ficavam para os ricos, os pobres se contentavam com minúsculos pedaços que se podia ver boiar dentro da sopa por uma lente de microscópio ultra-sensível. uma curiosidade: os animais podiam ser abatidos nos cemitérios da cidade e a carne deveria ser vendida em, no máximo, 3 dias, era o regulamento da profissão. se respeitavam? eu duvido!

nossos abonados parisienses adoravam carne a tal ponto que sofriam de gota e colesterol alto. as contas dos conventos provam que os monges atingiam a incrível marca de 6.000 calorias por dia!!! se um bife à parmegiana de 200 gramas equivale à 700 calorias, imaginem o quanto estes pobres vassalos de Deus não comiam! (alguma dúvida sobre o estereótipo de gordo atarracado que os monges europeus sempre tiveram?). queijo? sim eles comiam. acreditavam piamente que o laticínio ajudava a carne à assentar no estômago.

o parisiense consumia perto de 1 kg de pão por dia. Mas ricos e pobres tinham as suas diferenças: o pão branco ficava com os ricos, o misturado para os burgueses, o preto para os humildes e os porcos. No Castelo de Château-Thierry, cujo único vestígio é a Torre de Jean-sans-Peur (literalmente João-sem-Medo, dizem que ele era o cão!), o padeiro que dividia uma cozinha de 3.000 metros e que empregava 70 pessoas, assava entre 600 a 700 pães albinos por dia!

a melhor água que havia era a que caía do céu, rotulada de "água-maná". a do Sena e dos poços estavam regularmente poluídas, se desaconselhava a utilização mesmo fervida. se bebia cerveja, vinho e sobretudo água misturada ao vinho para disfarçar o gosto ruim da dita e fazer o milagre da multiplicação. não é à toa que o cólera era uma das doenças que mais assolava os medievais.

as receitas medievais exageravam nas especiarias: pimenta, canela, gengibre, açafrão, cravo, etc. eram apreciadas tanto por suas características excitantes quanto pelo colorido que davam aos pratos. mas os parisienses da época tinham outros defeitos: consumiam pouquíssimas frutas. os arqueólogos encontraram indícios de que comiam azeitonas e figos do Mediterrâneo, framboesas, morangos e maçãs - fruta que dava como chuchu na cerca. se comia como petiscos, principalmente antes de banquetes. as crianças medievais também gostavam de roubar maçãs nos pomares dos nobres.

o povo geralmente fazia a sua primeira refeição às 11h00 e a segunda e última às 17h00, eram pratos bastante simples e pouco variados, se comia praticamente a mesma coisa todos os dias: sopa à base de ervilhas quebradas, feijões secos, legumes ou ossos. pra dar um gosto eles misturavam pimenta, alguma especiaria que estivesse à mão ou alho. queijos, ovos e carne apenas em ocasiões très especiais, eles mal sentiam o cheiro dessas iguarias. um costume muito apreciado era o de se cozinhar dentro das bacias de água com sabão, onde havia se lavado a roupa... dizem que o sabor que "pegava" na comida não tinha igual!

na mesa do rei, em Vincennes, os arqueólogos encontraram traços de 23 tipos de peixes, sendo que 80% eram de água salgada. nas cozinhas reais se saboreavam banquetes de camarões, carpas, esturjão e salmão. na casa dos poderosos as refeições eram verdadeiros festivais. constituídos de 5 serviços, cada um comportava vários pratos os quais os convidados tinham acesso segundo a sua posição social. entre o prato principal, (invariavelmente um assado) e a sobremesa, os pratos do meio eram uma verdadeira demonstração da imaginação dos chefs. já imaginou um castelo feito de massa preenchido por aves que voavam no meio do serviço? que tal uma cauda de pavão em folhas de ouro ou almôndegas disfarçadas de maçãs verdes? para os nobres guerreiros eles poderiam apresentar um galo com elmo montado num leitão, idéias fantásticas não faltavam!


mas o que os ricos e famosos da Era Medieval gostavam mesmo era de ver os seus brasões esculpidos nas tortas e potes de geléia, era uma gente que gostava de ostentar e aparecer. outra coisa divina que o rei fazia era “tatuar” o próprio rosto nas maçãs, veja que idéia delicada! caso você seja proprietário de uma macieira pode copiar a idéia, eu ensino: quando a maçã ainda estiver verde, você deve encapá-la com um saquinho vazado com o formato do seu rosto ou outra imagem que você queira. assim que a maçã estiver madura e vermelha o seu rosto estará impresso nela, não é maravilhoso? Versailles ainda faz assim, não esqueça de pedir a sua maçã real! eu já tenho a minha, bien sûr!